Olha uma última vez o rosto no espelho de prata polida e sai. O ondulado dos véus reflecte-se intermitente nos escudos dos guardas ao longo do corredor que as tochas mal iluminam. Descalça sobre o mármore, os olhos marcados a khol, a boca vermelha e complacente, o corpo brilhante de óleos aromaticos, caminha consciente das línguas a humedecer os lábios e dos olhares escusos e proibidos que a seguem. Hesita, demora o passo, quer-se admirada, que pela última vez a vejam inocente e virgem. No refazer do caminho as lágrimas e o sangue serão o rasto que deixar. Por um só olhar que se recusa terá vendido a alma, por um suspiro que não ouve será o seu gemido que vai acompanhar, na noite infindável, a bandeja da vingança.
Detém-se ante a magnificente porta de bronze. O rumor da festa é difuso e o som dos tambores, surdo e baixo provoca-lhe um arrepio de temor. Recorda os olhos ardentes que a negam, as mãos que lhe fogem, os cabelos que quer entre os dedos. Apruma o corpo perfeito, solta num gesto rápido os cabelos de fogo e bate as palmas. O tilintar das joias marca já o ritmo a cadênciar as ancas e enquanto a porta se abre grita-se o seu nome:
Salomé
Foto Google
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