sábado, 7 de agosto de 2010

:
:

:
:
Chagas Ramos - Artificio sobre o Tejo
:
:
:
É sobre o rio que me vejo inteira e nua
debruçada sobre as pedras a lavar lençóis de mágoa
memórias desbotadas de gritos sem sentido
restos de sonhos que o tempo amarrotou.
É do rio que me vem com as marés
o cheiro a mar aberto a vento e chuva fria
que um dia me revolveu e encharcou
as asas com que já não sei voar como sabia.
É no rio que desaguo a raiva de ter sido
a ponte entre margens que não quis perder
perdulária do tempo da certeza 
e me encontro de novo e nova em mim.  
:
:
:
:


:
:
Sereníssima a tarde caía como um véu de paz a cobrir a cidade
o canto preguiçoso dos pássaros chamava a noite
e a brisa era um afago na última claridade do dia.
Tão pouco e tanto, na marcha das horas imparáveis,
o contentamento breve, intenso e iluminado 
de um momento com sabor a eternidade.
:
:
Foto Ana Oliveira
:
:

terça-feira, 3 de agosto de 2010

:
:

:
:
O medo é uma brasa a arder no coração das flores
mata de sede como as searas que a chuva abandona
e o chão abre-o em fendas para que o pranto
lhe regue a colheita de mágoas.
O medo é um cardo
teve o cheiro do nardo e a sombra do trigo
antes de ser semente enlouquecida
na agonia de germinar e ganhar raíz em terra de ninguém.
O medo tem dedos como ferros
apertados na garganta sem palavras.
:
:
Foto Ana Oliveira
:
: